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terça-feira, 22 de dezembro de 2015

O retorno das pombas à catedral de DIJON

As gárgulas da catedral de Dijon passavam muito frio no Natal
As gárgulas da catedral de Dijon passavam muito frio no Natal




Na Borgonha, as pedras nunca são brancas por vontade de Deus.

Ao contrário, com o passar dos anos e dos séculos elas ficam bem cinzentas e até pretas.

No alto da catedral, as gárgulas – aquelas esculturas de animais quiméricos colocadas para dar vazão às águas de chuva e qualquer outra sujeira tirada por esta do telhado –, sempre bem alinhadas, estavam mais do que feias.

Mais. Sentiam-se doentes e tristes no seu pétreo silêncio.

Por obra dos entalhadores, elas tinham formas de diabos, monstros e animais horríveis.

O vento, a chuva, as geadas, as fumaças, tudo contribuía para deixá-las mais estragadas, repulsivas e decadentes.

Acontecia também – e ninguém sabia explicar – que as pombas tinham diminuído em número, a ponto de quase desaparecerem.

Só restavam algumas, mas estavam velhas e doentes. Já não se via seu vulto branco no céu e nos galhos das árvores.

quarta-feira, 9 de dezembro de 2015

A Luz de Cristo nas catedrais

Catedral Santo Estêvão, Viena.




Entrando no recinto sagrado de uma catedral, o povo exerce, sem sabê-lo, um magnífico ato coletivo de discernimento dos espíritos!

Assim como quando acabou o Dilúvio um arco-íris pousou sobre a terra, assim também, quando o aperfeiçoamento da Igreja e da obra de Nosso Senhor Jesus Cristo na terra chegou a um determinado grau, as almas humanas receberam esse discernimento.

Trata-se de um enorme discernimento coletivo. É como se uma luz do Divino Espírito Santo se tornasse sensível à mente dos homens.

E eles discernem belezas na Igreja Católica que eles traduzem nos modos maravilhosos que o estilo gótico excogitou.

Esse discernimento se manifestava não só na arte eclesiástica. Ele vivia palpitante em mil outros aspectos da vida real!

Na corporação de ofício, na aldeia de marzipã, na inocência dos camponeses que nos aparecem nas iluminuras ou nos vitrais, na paz dos gizantes com as mãos postas, numa tranquilidade desconcertante para nós, homens de hoje.

quarta-feira, 25 de novembro de 2015

Faça uma visita virtual à catedral de ESTRASBURGO

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A catedral de Nossa Senhora que venceu incêndios e guerras infernais, e até a Revolução Francesa!

A catedral emerge entre os tetos da cidade
A catedral emerge entre os tetos da cidade
A 'coluna dos anjos'.
A 'coluna dos anjos'.
A Catedral de Estrasburgo ou Catedral de Nossa Senhora de Estrasburgo (em francês Cathédrale Notre-Dame-de-Strasbourg; em alemão Liebfrauenmünster zu Straßburg) é a catedral católica mais importante na região de Alsácia, que faz uma síntese entre a França e a Alemanha.

No tempo do paganismo, no local existiu um templo dedicado ao deus romano Marte.

O bispo Arbogast, no século VII, deitou as bases de um templo dedicado a Nossa Senhora, do qual não se conservam vestígios.

Pois, já no século seguinte, a primeira igrejinha foi substituída por uma catedral assaz mais importante, concluída sob o reinado do imperador Carlos Magno.

Essa catedral carolíngia possuía três naves e três absides que o bispo D. Ratal mandou ornar com ouro e pedras preciosas.

Mas, essa catedral foi atingida por incêndios nos anos 873, 1002 e 1007.

quarta-feira, 11 de novembro de 2015

França, berço do estilo gótico

Basílica abacial de Saint-Denis, Paris, França, ábside.
foto David Iliff



O núcleo central do gótico tomou forma na região francesa da Île-de-France, e que abarca a zona de Paris e arredores. Portanto, a abadia de Saint-Denis e a catedral de Notre-Dame.

Estendeu-se depois com celeridade a todo o território francês, e transpondo-o, ramificou-se por toda a Europa católica.

O estilo gótico não ficou parado, mas desenvolveu-se prodigiosamente, dando origem a inúmeras variantes cujo estudo requereu muitos tratados. E ainda outros estão sendo escritos.

Uma catedral inspira outra, mas nenhuma é igual. Cada qual oferece e desenvolve um aspecto novo.

Nunca há ruptura com os ideais anteriores, mas antes uma assimilação de elementos novos ou antiquíssimos.

O avanço técnico é prodigioso, nas mãos das corporações de construtores, grupos formados pelos mestres anônimos a serviço das construções monásticas ou episcopais, que se movem livremente de obra em obra e elaboram novas técnicas.

A decoração interna e externa dos edifícios tornou-se complexa e requintada. A perfeição da geometria das formas se inspirava no Templo de Salomão, que Deus revelou como está nas Escrituras. Mas em certo sentido a superava.

Vitrais, estátuas e baixo relevos narram a Bíblia, a vida dos santos, a teologia, a filosofia, descrevem os grandes homens da Antiguidade inclusive greco-romana, as atividades das profissões, as estações dos anos, a disposição dos astros. Em resumo: a Ordem do Universo. 

quarta-feira, 28 de outubro de 2015

A catedral gótica: resumo da ordem do universo,
onde Deus faz suas delícias

Catedral de Soissons, França. foto David Iliff.
Catedral de Soissons, França.
foto David Iliff.



No contexto medieval dos séculos XI e XII, as escolas monásticas e episcopais sediavam grandes escolas de teologia.

Essas escolas procuraram explicitar a fundo a ordem posta por Deus na Criação para a Sua maior glória. A ordem do universo contida na Bíblia foi cotejada com os ensinamentos aproveitáveis dos gênios gregos e romanos da antiguidade.

O estudo, a contemplação, a meditação e a oração permitiram aos mestres espirituais medievais atingir um conhecimento profundamente raciocinado da grandiosidade e do simbolismo da glória de Deus e da Igreja, impressos na imensa catedral divina que é o Universo.

O gótico nasceu como sendo o estilo mais adequado para exprimir a fisionomia com que Deus que Se faz conhecer na Criação.

Por isso a catedral, que já era a casa de Deus por excelência, tinha que conter em si, embora em miniatura, a majestosa ordenação espiritual, metafísica e material de toda a estrutura e de toda a beleza do criado.

Na hora de reconstruir a abadia real de Saint-Denis, hoje na periferia de Paris, o abade beneditino Suger vivificou a primeira catedral gótica.

quarta-feira, 14 de outubro de 2015

Estilo gótico, estilo de uma sociedade
que está bem com Deus

Transepto da catedral de Amiens, França.
foto David Iliff.
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de
política internacional,
sócio do IPCO,
webmaster de
diversos blogs







O estilo gótico nasceu e cresceu dando passos aparentemente pequenos, até gerar um conjunto monumental como nenhum outro na História da Civilização.

Nenhum estilo histórico é uma produção de gabinete, mas é obra de uma sociedade inteira.

Os artistas não são os criadores do estilo usado por uma sociedade, mas seus intérpretes.

E isto é especialmente verdadeiro do estilo gótico ou medieval.

Nesse estilo produzido pela sociedade medieval, o prático e o belo, os elementos materiais e intelectuais se fundiram harmonicamente com a fé católica professada pela sociedade.

Do ponto de vista arquitetônico que foi tão decisivo, o estilo gótico tem como elemento característico a chamada ogiva gótica.

Segundo a tradição, num sonho, São Pedro e São Paulo teriam aparecido a um velho abade beneditino de nome Gunzo, que foi terminar seus dias na abadia de Cluny. Os santos lhe ensinaram a ogiva, que depois se chamou gótica.

O sonho do abade Gunzo que inspirou o arco gótico
na abadia de Cluny III.
Miscellanea secundum usum ordinis Cluniacensis
O velho monge narrou o sonho ao abade São Hugo. Na época, por volta de 1080 d. C., Cluny estava construindo sua terceira grande igreja abacial, dedicada a São Pedro.

Ela foi a maior igreja da Cristandade até a construção da Basílica de São Pedro, no Vaticano, feita um metro maior, para afirmar assim sua superioridade universal.

O monge Gunzo era cego, mas seu testemunho foi considerado fidedigno e convincente. A parte final da nave de Cluny foi concluída no novo estilo ogival.

O exemplo de Cluny pegou fogo em toda a Europa. Construir catedrais foi um fenômeno correlato às Cruzadas. O mesmo fervor animava os cavaleiros e os arquitetos.

O movimento se expandiu a partir da França em meados do século XII.

É por isso que na época medieval o estilo gótico era referido como art français, francigenum opus (trabalho francês) ou opus modernum (trabalho moderno).

O termo gótico foi cunhado pelo historiador renascentista da arte Giorgio Vasari (1511 —1574).

Para Vasari e seus colegas naturalistas, admiradores da arte pagã da Antiguidade, a arte da Idade Média, especialmente a arquitetura, era objeto de horror. Eles a consideravam o oposto da perfeição, o símbolo do obscuro e do negativo que o catolicismo havia inoculado nas massas.

O século XIX recuperou o estilo gótico.
E deu o neogótico.
Catedral St Patrick, de New York
Vasari atribuiu esse horror aos godos, povo que destruiu a Roma Antiga em 410. E inventou o termo gótico, com fortes conotações pejorativas. Ele quis designar um estilo digno apenas de bárbaros e vândalos.

No século XIX essa manipulação foi posta de lado. O gótico voltou a ser valorizado como merecia. Poetas como Goethe ficaram fascinados pela imponência das grandes catedrais góticas na Alemanha. Literatos como Victor Hugo empolgavam seus leitores com os relatos dos monumentos medievais.

Restauradores como Viollet-le-Duc se engajaram em hercúleos trabalhos, ainda em andamento, para restaurar catedrais, abadias, castelos, palácios e outras obras insignes.

Chefes de Estado como o Kaiser da Alemanha, Luís II da Baviera, Napoleão III ou a rainha Victória promoveram essas fabulosas restaurações ou até novas realizações em estilo medieval. O Parlamento de Londres e o Big Ben são um exemplo acabado da arte gótica.

A restauração do gótico ficou associada ao movimento contrarrevolucionário do século XIX.

E onde não havia catedral gótica para restaurar, os católicos se punham a erigir novas: St. Patrick, em Nova York, a catedral de São Paulo, ou as basílicas de Luján, na Argentina, e de Las Lajas, na Colômbia, para dar alguns exemplos.

Nesse momento nasceu o neogótico, marcado pelos elementos decorativos ogivais.


Cluny "alma da Idade Média" (reconstituição virtual)





GLÓRIA CRUZADAS CASTELOS ORAÇÕES HEROIS CONTOS CIDADE SIMBOLOS
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quarta-feira, 16 de setembro de 2015

A catedral enquanto esposa de Cristo

Catedral de Santo Estêvão, Viena, Áustria.
Catedral de Santo Estêvão, Viena, Áustria.



A catedral é também esposa de Cristo, como lembra ainda o Apocalipse :

2. Eu vi descer do céu, de junto de Deus, a Cidade Santa, a nova Jerusalém, como uma esposa ornada para o esposo.

3. Ao mesmo tempo, ouvi do trono uma grande voz que dizia: Eis aqui o tabernáculo de Deus com os homens. Habitará com eles e serão o seu povo, e Deus mesmo estará com eles.

4. Enxugará toda lágrima de seus olhos e já não haverá morte, nem luto, nem grito, nem dor, porque passou a primeira condição.

5. Então o que está assentado no trono disse: Eis que eu renovo todas as coisas. Disse ainda: Escreve, porque estas palavras são fiéis e verdadeiras.

6. Novamente me disse: Está pronto! Eu sou o Alfa e o Ômega, o Começo e o Fim. A quem tem sede eu darei gratuitamente de beber da fonte da água viva.

7. O vencedor herdará tudo isso; e eu serei seu Deus, e ele será meu filho.

8. Os tíbios, os infiéis, os depravados, os homicidas, os impuros, os maléficos, os idólatras e todos os mentirosos terão como quinhão o tanque ardente de fogo e enxofre, a segunda morte. (Apocalipse, 21, 2-8)

A catedral enquanto porta-voz e torre de vigia de Nossa Senhora

quarta-feira, 19 de agosto de 2015

Igrejas tradicionais: naus que levam ao Céu
pela linguagem dos símbolos

Igreja de São Mateus, Salers, França.
Igreja de São Mateus, Salers, França.



Quando nosso olhar é desviado das maravilhas da Encarnação pelas falsas ilusões sugestionadas por certo progresso técnico, custa perceber os tesouros simbólicos acumulados em nossos edifícios religiosos.

Entretanto, o simbolismo de catedrais e igrejas tem uma importância capital e nos está falando sempre de um significado mais alto.

A visão católica das coisas pressupõe que o mundo tem uma chave de interpretação que é divina.

E a Civilização Cristã nos mostra como o universo, e portanto nossa existência terrena, têm uma ordem profunda que deve ser obedecida.

quarta-feira, 22 de julho de 2015

Sainte Chapelle: capela do rei da França,
custódio da Coroa do Rei dos reis




continuação do post anterior: A Sainte Chapelle e a reversibilidade entre a ordem católica e a ordem monárquica



A Sainte Chapelle é ela própria um imenso relicário feito de luz e vitrais. As relíquias ficavam no altar mor em urnas de uma riqueza única.

Os melhores artistas fizeram essas peças com um refinamento e uma exibição sem igual de pedras preciosas e ouro.

Ao pé de cada coluna, doze no total, a estátua de um Apóstolo como que segura o prédio. Em poucos anos foram instalados 750 metros quadrados de vitrais formando um grandioso livro de imagens.

Há um modo especial de ler esse livro, é um discurso maravilhoso que transmite os grandes fatos da Bíblia com uma insistência particular no Antigo Testamento.

Na parte central, os vitrais pintam a Paixão de Cristo, aponta Christophe Bottineau, arquiteto chefe dos Monumentos Históricos. No lado sul, onde bate mais o sol, é apresentada a dinastia dos reis de Israel que termina na pessoa de São Luís.

Não sabemos quem concebeu este livro de imagens. Quiçá o próprio São Luis, por que não? pergunta Le Pogam.

A epopeia bíblica descrita nos vitrais reforça o paralelismo com a monarquia do povo eleito do Novo Testamento.

David rei de Israel, Salomão fundador do Templo, Moisés o legislador e Aaron, primeiro Sumo Sacerdote coroado com uma coroa que parece com a tiara do Papa, são prefiguras da ordem católica medieval.

quinta-feira, 9 de julho de 2015

A Sainte Chapelle e a reversibilidade
entre a ordem católica e a ordem monárquica




A Sainte Chapelle foi mandada construir pelo rei da França São Luis IX (1214 – 1270), na metade do século XIII, em Paris, capital de seu reino.

São Luis foi um monarca santo em quem se fundiram duas dimensões: a política e a religiosa. A Sainte Chapelle permite, entre outras coisas, compreender melhor a reversibilidade dos dois aspectos no rei santo.

Um rei construtor, um rei-sacerdote – no senso da missão sacerdotal da aristocracia definido pelo Papa Bento XV – um rei cruzado, um rei santo, um rei modelo que deixou uma das mais belas joias da arquitetura da Idade Média.

A Sainte Chapelle é um magnífico livro de imagens que atravessou oito séculos, não sem arrostar grandes perigos.

Os reis da França na Idade Media eram ungidos pela Igreja e, portanto tinham também uma missão religiosa. A unção dos óleos sagrados marcava a origem divina da autoridade suprema do reino.

Essa associação entre a monarquia e a religião católica ajuda a compreender a Sainte Chapelle.

A comunicação de Deus com o povo e o reino passava através de São Luís. Ele devia proteger o povo cristão, propagar o cristianismo, defender o clero e conduzir seu povo rumo à Jerusalém celeste, rumo a salvação eterna.

quarta-feira, 24 de junho de 2015

A coroação dos reis da França na catedral de REIMS

Catedral Notre Dame de Reims, nave lateral esquerda.
Catedral Notre Dame de Reims, nave lateral esquerda.
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de
política internacional,
sócio do IPCO,
webmaster de
diversos blogs








continuação do post anterior: REIMS: a catedral da sagração dos reis da França



O Guarda dos Selos de França, desempenhando a função de Chanceler, sobe ao altar do lado do Evangelho e chama os doze pares para junto do rei.

Ao som do órgão, o arcebispo coloca sobre sua cabeça a coroa de Carlos Magno, enquanto os duques e pares a tocam com a mão, como símbolo de assistência, obediência e fidelidade.

Depois que o rei pôs sobre os ombros o grande manto azul forrado de arminho e semeado de flores-de-lis de ouro, é conduzido – com a coroa na cabeça, o cetro na mão direita e o bastão da justiça na esquerda – até o trono, onde se assenta.

Os pares o abraçam e proclamam por três vezes: “Vivat Rex in aeternum!” É a entronização.

Os clarins tocam, as portas da catedral se abrem de par em par, e a multidão, enchendo a nave com suas aclamações durante vários minutos, acorre para ver o Rei que Deus lhe deu.

Enquanto o arcebispo começa a missa, das abóbadas são soltos pequenos pássaros simbólicos. Arautos d’armas lançam medalhas da sagração.

Há salvas de mosquetes, descargas de artilharia.

Coroação de Felipe VI, Bibliothèque National de France
Coroação de Felipe VI, Bibliothèque National de France
Sinos tocam “à toute volée” nas paróquias e nos conventos, e o imenso clamor de alegria que percorre a cidade anuncia à França que o trono acabou de receber o Filho de São Luís.

“La belle journée que celle du sacre! Je ne l’oublierai de ma vie” – exclamou emocionada Maria Antonieta.

Exigia uma tradição, perpetuada desde os tempos de São Luís, que o Rei da França destinasse um dia, nas festas de sagração, para curar as lamentáveis chagas físicas dos doentes de seu reino. Era uma tarefa repelente e meritória.

Dois mil e quatrocentos escrofulosos e cancerosos enfileiravam-se de ambos os lados duma comprida alameda, que atravessava o parque à direita da igreja.

“Com o calor – diz o Duque de Croy, que assistiam ao episódio – o mau cheiro era tremendo e o ar estava infecto, de sorte que era preciso muita coragem e força ao rei para tomar parte nessa cerimônia, que eu não teria julgado, antes de a ver, tão rude e repugnante”.

"O rei te toca, que Deus te cure". E os doentes saravam...
"O rei te toca, que Deus te cure". E os doentes saravam...
Acompanhado dos marechais de França e dos oficiais da coroa, Luís XVI, sem se deixar desanimar pelo cheiro e pelo aspecto daquelas chagas horrendas, tocava paternalmente cada um dos enfermos na fronte, nas duas faces e no queixo, fazendo o sinal da Cruz, e dizendo, cada vez, esta frase:

– O Rei te toca, Deus te cure.

Conta a tradição que numerosos doentes saiam curados naquelas ocasiões.



VEJA TAMBÉM:

As curas de REIMS: sinal do aprazimento de Deus com a monarquia francesa

“Le roi te touche, Dieu te guerisse” ‒ “O rei te toca, Deus te cure”





História da catedral de Notre-Dame de Reims

A Catedral de Notre-Dame de Reims disputa com as catedrais de Paris e Chartres, também dedicadas a Nossa Senhora, o título da catedral gótica mais importante da França.

Localiza-se na cidade de Reims, na região de Champagne, produtora do famoso vinho espumante. Como quase todas as grandes catedrais, a atual foi construída no século XIII em substituição a uma antiga igreja.

São Remígio, bispo de Reims, batiza Clóvis, rei dos Francos
São Remígio, bispo de Reims, batiza Clóvis, rei dos Francos
Nos tempos bárbaros e romanos, Reims foi um importante centro comercial. Os romanos chegaram no ano 58 a.C. e encontraram uma região rica em vinhos, madeira, carne e lã, e com ela fizeram aliança.

No ano 250, Reims já era sede do bispado de Champagne, e a conversão das hordas bárbaras ao catolicismo foi conseguida pelos religiosos de Reims.

O marco histórico foi o batismo de Clóvis I, rei dos francos, no ano 498. Clóvis e seu povo deram origem à França e foram o braço armado da Igreja Católica nos caóticos tempos após a queda do Império Romano.

A primeira catedral foi uma pequena igreja, consagrada a Nossa Senhora na época do batismo de Clóvis. No ano 816, ela foi reconstruída para abrigar a cerimônia de coroação do rei da França.

A atual catedral foi iniciada em 6 de maio de 1211 pelo arcebispo Aubrey de Humbert.

Na década seguinte foi completado o coro e as capelas laterais indispensáveis para a celebração da Missa.

A fachada principal foi iniciada em 1252 por Jean le Loupe e os pórticos foram concluídos em 1256.

Em 1299, Robert de Coucy completou a fachada até o nível onde está situada a Galeria dos Reis. A guerra dos Cem Anos, a grande peste de 1348 e um grande incêndio em 1481 atrasaram o projeto.

Aa catedral atingiu a aparência atual apenas 300 anos após a colocação da pedra fundamental, e ainda alguns elementos como as torres permanecem incompletos.

O comprimento da nave chega a 139 metros, maior que Chartres. A largura é de 13 metros e a altura de 35 metros (equivalente a um prédio de doze andares)

Santa Joana d'Arc, imagem na catedral de Reims
Santa Joana d'Arc, imagem na catedral de Reims
A área construída é de 6.650 m2, e a catedral de Reims é, além de belíssima, é uma das maiores obras arquitetônicas e religiosas da humanidade.

O projeto previa a construção de sete torres, mas apenas as torres da fachada principal foram concluídas.

Em 1917, em plena I Guerra Mundial cerca de 300 bombas incendiarias danificaram gravemente a abóbada. A restauração ficou concluída em 1937.

Em 17 de julho de 1429 sob o auspício de Santa Joana D’Arc foi coroado o rei Carlos VII, fato histórico que encaminhou o fim da guerra dos Cem Anos.

Na ocasião, disse ela: “Nobre Rei, assim é cumprida a vontade de Deus, que desejava que eu liberasse a França e vos trouxesse à Reims, para receberdes esta sagrada missão e provar à França que sois o verdadeiro Rei”.

Santa Joana D’Arc é cultuada como a maior heroína e uma santa protetora da França.

Leia a milagrosa gesta de Santa Joana d’Arc:

1. A epopeia gloriosa de Santa Joana d’Arc entra pelo III milênio

2. Tribunal tenta enganar a heroína

3. Missão profética da Donzela de Orleans

4. Uma donzela que desfez o melhor exército da época

5. Sagração do rei em Reims

6. Juízes venais, filosoficamente democráticos, condenam a santa

7. A virgem guerreira na fogueira

8. O grande retorno da heroína santa



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quarta-feira, 10 de junho de 2015

REIMS: a catedral da sagração dos reis da França

Catedral Notre Dame de Reims, vista interior da nave central
Catedral Notre Dame de Reims,
vista interior da nave central
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de
política internacional,
sócio do IPCO,
webmaster de
diversos blogs








Toda civilização começa pelos padres, pelas cerimônias religiosas, pelos milagres mesmo. Nunca houve, nunca haverá, não pode haver exceção a esta regra.

Os reis da França conheceram estas leis comuns a todos os povos, quando São Remígio em Reims ordenou a Clóvis, ao sagrá-lo rei dos francos:

“Curva tua cabeça, ó sicambro, adora o que queimaste e queima o que adoraste”.

Entretanto, o poder do Rei da França vem de Deus a um outro título mais especial. Certo dia, Santa Joana d’Arc pediu ao Rei Carlos VII que lhe desse seu reino. Carlos VII ficou embaraçado, mas acedeu.

Santa Joana d’Arc fez lavrar um documento atestando o fato. Depois, em presença dos mesmos tabeliães, e como senhora da França, entregou-a a Deus, Rei do Céu.

E o Rei do Céu e Rei da França, por intermédio da mesma Joana, instituiu Carlos, como também a seus sucessores, seu procurador divino.

Católica, sabedora bastante de que era só no seio da Igreja que ela atingia sua perfeita plenitude, era assim, como procurador de Deus, que a França jubilosa aceitava e gostava de ver o seu rei.

Por isso, nada a empolgava tanto quanto o momento em que ele, na mesma catedral de Reims, ajoelhado diante do grande Pontífice, ouvia estas palavras solenes:

“Eu vos sagro Rei com este Santo Óleo, em nome do Padre e do Filho e do Espírito Santo”.


A cerimônia da sagração de Luís XVI começou com orações às seis horas da manhã do Domingo da Ssma. Trindade de 1775. 

Mas desde as quatro toda a nave estava cheia, e as damas, com trajes de gala, instaladas em seus lugares.

Sagração de São Luís IX.  Charles Amédée Philippe van Loo (1719 – 1795)
Sagração de São Luís IX.
Charles Amédée Philippe van Loo (1719 – 1795)
Erigira-se uma tribuna para que Maria Antonieta e as princesas pudessem ver melhor, sem se misturar com a multidão.

Na nave tinham-se colocado, pela ordem, os príncipes de sangue, os duques, os marechais de França, os pares eclesiásticos, o clero e a magistratura.

Às seis horas e meia, entrada solene dos seis príncipes, coroados e envergando seus mais suntuosos trajes de cerimônia, e representando os três mais antigos ducados e os três mais antigos condados do reino.

São eles: Monsieur, le Comte d’Artois, le Duc de Bourbon, que constituem os seis pares leigos. Os seis pares eclesiásticos trajavam vestes pontificais.

Segundo o cerimonial tradicional, o Rei esperava deitado, vestido com longa túnica de rendas de prata, no leito de Luís XIII, como se estivesse dormindo.

Os dois bispos batem à porta. Do interior, o Duque de Bouillon, camareiro-mor, pergunta:

– A quem procurais?

– Ao Rei – dizem os bispos.

– O rei dorme – replica o camareiro-mor.

– Procuramos Luís XVI, que Deus nos deu para Rei.

Abre-se então a porta, e os dois bispos abençoam o Rei. Em seguida, a entrada solene na catedral.

Enquanto os sinos repicam, o arcebispo e o clero vêm à frente do cortejo real, aberto pelo Condestável de França, representado pelo velho Marechal de Clermont-Tonnerre, portando a espada real, com a ponta para o alto.

Seguem-se cem guardas suíços com oboés, tambores, clarins, flautas e pífaros; os duques – o de Bouillon, o de Duras e o de Liancourt – e nove condes, com suas coroas, longos mantos de arminho e túnicas de ouro.

O futuro rei ficava aguardando ser chamado no Palácio do Tau,  contiguo à Catedral
O futuro rei ficava aguardando ser chamado no Palácio do Tau,
contiguo à Catedral
Depois, entre os dois bispos delegados, o Rei. Por fim os capitães das guardas, com túnicas e mantos de tecido de ouro, e todo o séquito com mantos de cetim branco.

É soberbo o espetáculo desse desfile de trajes de ouro, prata, rendas, veludo e seda, em que dominam o negro, o branco e o roxo, com alguns tons de púrpura e vermelho que realçam o todo.

Sua Majestade senta-se numa poltrona colocada sob o grande dossel erguido no meio do santuário.

O venerável arcebispo de Reims, o Cardeal de la Roche-Aymon, belo com seus mais de oitenta anos, fez questão de oficiar em pessoa, apesar da idade.

Depois do Veni Creator, o prior-mor da abadia de Saint-Rémy se apresenta à entrada da catedral, trazendo a santa âmbula, que tem origem milagrosa.

Foi trazida por uma pomba vinda do Céu, para a sagração de Clóvis. Desde então, ficou sob a guarda do prior de Saint-Rémy. Não deixa a abadia senão para a unção dos reis de França.

O prior-mor a conduz, montando um cavalo ajaezado com seda branca – como a pomba milagrosa – sob um dossel levado pelos quatro barões da santa âmbula: os Srs. de la Rochefoucauld, de Talleyrand, de la Rochechouart e de la Roche-Aymon.

Assim que o arcebispo recebe a santa âmbula e a coloca sobre o altar, o bispo-duque de Laon e o bispo-conde de Beauvais levantam Luís XVI de seu trono, para perguntar aos assistentes se o aceitam como rei.

A resposta a essa pergunta consistia num silêncio respeitoso, que substituía as aclamações de outrora.

O arcebispo se aproxima do rei e pede-lhe segurança e proteção para a Igreja, que o rei promete. Depois os dois bispos apresentam-lhe a fórmula do juramento real, que ele, sentado e de cabeça coberta, pronuncia em latim e em voz alta.

Obriga-se a manter a paz na Igreja de Deus, exterminar as heresias, defender seu povo contra as rapinas e as iniqüidades, governar com justiça e misericórdia, mantendo a ordem no reino, e morrer na Religião.
A Santa Ampoula com o óleo miraculoso com que foram sagrados todos os reis da França desde a conversão de Clóvis
A Santa Ampoula com o óleo miraculoso com que foram sagrados
todos os reis da França desde a conversão de Clóvis

Presta também os juramentos de soberano grão-mestre da Ordem do Espírito Santo e da Ordem de São Luís, e jura observar os editos sobre os duelos.

Levado até o altar e desvestido de sua veste de prata, ao seu lado se prosterna o arcebispo, e os bispos recitam as ladainhas, alternando com o coro. É a humilhação antes da exaltação.

Em seguida o arcebispo, tomando o óleo da santa âmbula, faz-lhe sete unções, dizendo:

“Eu vos sagro Rei, com este Santo Óleo, em nome do Padre, do Filho e do Espírito Santo”.

Sobre o altar se acham preparados a coroa de ouro, pedras preciosas e diamantes, o cetro de ouro de Carlos Magno, o bastão de justiça e o manto real.

São entregues ao rei, com estas palavras:

“Recebei este cetro, símbolo do poder real, cetro de retidão e regra de virtude, para bem conduzirdes a vós próprio, a Igreja e o povo, para vos defenderdes dos maus, corrigirdes os perversos e poderdes passar dum reino temporal a um reino eterno”.

O Rei está sagrado. A cerimônia da coroação vai começar.